Entrevistado: Carlos Fragoso, contabilista certificado

Entrevista: Carlos Fragoso, contabilista: pagamento do subsídio de refeição em cartão “É uma recomendação que faço a todos os clientes”

Carlos Fragoso, 62 anos, é Técnico Oficial de Contas há 38 anos – na verdade, a designação atual, começa por explicar, é contabilista certificado. Tem um leque variado de empresas como clientes. Considera que a sua função junto dos clientes tem um cunho pedagógico, nomeadamente para fazer ver as vantagens do pagamento de subsídio de refeição em cartão, para empresas e trabalhadores. Foi esse o tema da nossa conversa.

Começamos talvez por falar dos benefícios fiscais do pagamento em cartão para as empresas?

Para as empresas, os benefícios são a isenção de contribuição para a Segurança Social (a taxa de 23,75%), até ao valor de 8,32 euros no cartão refeição e de 5,20 euros em dinheiro. Para o trabalhador, o benefício é a não incidência em sede de IRS e Segurança Social. Portanto, os trabalhadores estão isentos de Segurança Social e IRS até estes limites. Se o subsídio de refeição for superior a estes valores, o diferencial fica sujeito às taxas de IRS e de Segurança Social normais.

O que significa que para as empresas é bastante mais benéfico…

Bastante mais benéfico.

Independentemente da dimensão da empresa?

Sim. Porque o benefício para as empresas é em sede de Segurança Social e de IRC. Ou seja, o custo do subsídio de alimentação abate à matéria coletável dos impostos em sede de IRC. No caso do trabalhador, está isento de pagar os 11% de Segurança Social e o IRS correspondente. Portanto, há aqui um duplo benefício quer para os trabalhadores, quer para as empresas.

Costuma sempre aconselhar os seus clientes (empresas) a usarem cartões?

Sim, porque isso traduz-se num acréscimo ao valor do salário sem que implique um agravamento dos impostos. Quer para a entidade patronal, quer para o trabalhador. Têm toda a vantagem nisso. É uma recomendação que eu faço a todos os clientes.

Outros contabilistas fazem essas recomendações?

Nas grandes empresas é usual esse tipo de complemento – no fundo, trata-se de um complemento salarial. Nas micro e médias empresas, muitas vezes o subsídio é pago em dinheiro, ou porque num universo de 4-5 pessoas na empresa há duas ou três que não querem, ou porque não veem nenhuma vantagem, acham que o que ganham com a isenção são trocos.

Carlos Fragoso, contabilista certificado.
Carlos Fragoso, contabilista certificado

O subsídio de refeição é um complemento – não faz parte do salário, é dado com o intuito de ajudar à alimentação. O uso do cartão também ajuda a que esse valor seja usado sobretudo para esse fim, e não para fins paralelos?

Sim, e o próprio termo diz exatamente isso – é um subsídio para alimentação do trabalhador. O subsídio de alimentação está na maior parte dos casos instituído em contratos coletivos de trabalho. Não implica que as empresas cujo contrato não obriga a isso não o façam. Até por uma questão de justiça e de enquadramento com o resto dos trabalhadores. Porque é que na empresa A as pessoas recebem e na empresa B, ao lado, não? Porque tem um contrato diferente, porque o sindicato não teve essa atuação? Portanto, o subsídio de alimentação tornou-se praticamente universal, como complemento salarial.

As empresas têm de estar mais atentas?

Isso também é uma função pedagógica dentro das empresas – eu tenho tido essa preocupação, quer no que toca ao subsídio de alimentação, quer à distribuição de resultados. Ao longo destes 30 e muitos anos de trabalho pugnei sempre por que as empresas, desde que obtenham resultados com caráter regular na sua atividade e que não haja grandes modificações ao nível da gestão, deveriam fazer com que uma parte dos resultados concorra para benefício do trabalhador. Embora não seja uma obrigatoriedade. O facto de não ser vinculativo tem essa nuance: não obriga a empresa a fazê-lo todos os anos. A empresa tem benefícios em termos de impostos porque a parte que dá aos trabalhadores não é coletada. É evidente que em sede de IRS e Segurança Social isso não se passa, porque os trabalhadores vão ter de pagar o IRS e a Segurança Social dessa distribuição. Isso devia, na minha opinião, estar isento, como o subsídio de alimentação.

Há uma série de países, como a Bélgica, que já têm cartões semelhantes ao do subsídio de refeição, mas para outras coisas: educação, cultura, transportes, saúde, energia, terceira idade… vê vantagens, tanto para as empresas como para os trabalhadores, em que outros benefícios que a empresa dê ao trabalhador passem também pelo cartão?

Sim, em todos os aspetos. Pego num tema que é mais residual em relação à filosofia disto tudo, que é o cartão cultura: quanto a mim, devia ser uma das prioridades em Portugal. A iliteracia é grande. A maior parte das pessoas não vai a um teatro, não compra jornais… tudo isso, de uma forma direta ou indireta tem reflexos na empresa, no local de trabalho. Quanto mais o trabalhador for iletrado nessas áreas, menor é o conhecimento. E o investimento em conhecimento, para mim, é fundamental. Não faço questão que as pessoas estejam a estudar dia e noite para tirar um curso – é bom em termos curriculares, para a carreira profissional, mas depois falta o resto, falta essa componente. Porque há um abandono, a partir daí. Por exemplo, um engenheiro informático que se licenciou, chegou a um ponto da vida dele em que se instalou no seu emprego, faz aquela função, e se não tiver este tipo de estímulos, que é conhecimento adquirido por leitura de jornais e livros (e Portugal tem índices muito baixos de leitura)… isto para mim tem importância, é relevante.

Sim, até porque quanto mais conhecimento os trabalhadores têm, maior pode ser o seu contributo para a empresa. Carlos Fragoso, muito obrigada por esta entrevista.