Títulos de refeição em Portugal: o que são, como funcionam e quais as suas vantagens
O subsídio de refeição é hoje uma componente muito valorizada do pacote de benefícios que as empresas atribuem aos trabalhadores portugueses. Mostramos aqui as várias conquistas, mas também os desafios que este benefício social enfrenta em Portugal, com foco no sistema de títulos de refeição.
O que é – e o que não é – o subsídio de refeição?
Desde 1974, o caráter excepcional do subsídio de refeição foi preservado e mesmo reforçado: as alterações da legislação, a generalização do pagamento em títulos em vez de dinheiro e as inovações tecnológicas tornaram-no mais simples e relevante na vida das pessoas, mas também das empresas e dos pequenos negócios que dele beneficiam, com vantagens económicas para todos.
Um primeiro ponto: este não é um benefício obrigatório, consagrado na legislação laboral portuguesa (ao contrário do subsídio de férias, por exemplo). Ter ou não ter subsídio de refeição depende, portanto, do contrato que os trabalhadores têm com a empresa, seja ele individual ou coletivo. É um dos benefícios mais frequentes dos trabalhadores portugueses, juntamente com o seguro de vida, o seguro de acidentes e o seguro de saúde, de acordo com um estudo da Mercer de 2019.
O pagamento do subsídio de refeição é uma das formas encontradas para pôr em prática uma ideia que, ao longo dos tempos, se tornou evidente: a de que é fundamental garantir que os trabalhadores têm acesso a uma alimentação adequada, que contribua para a sua saúde e a sua produtividade, com benefícios para toda a economia e sociedade.
O trabalhador recebe este benefício para pagar as despesas a que é obrigado para se alimentar durante o seu horário de trabalho. Se o trabalho for em part-time e inferior a cinco horas diárias, desde que previsto no contrato individual ou coletivo, o valor do subsídio é proporcional.
E, como veremos adiante, tem também um estatuto fiscal diferente, com vantagens adicionais se o pagamento for feito, não em dinheiro, mas em títulos de refeição – por exemplo, com cartão ou em vales que se trocam por refeições nos estabelecimentos que aderiram à rede.
Como chegámos até aqui?
Foi apenas em 1979 que o subsídio de refeição teve direito a enquadramento na lei portuguesa, embora já antes houvesse empregadores a atribuí-lo e até empresas a emitir títulos de refeição. O decreto-lei 297/79 estabeleceu regras excecionais para este benefício social, que ficava isento do pagamento de imposto até um determinado valor.
Este valor correspondia ao subsídio de refeição atribuído à administração pública. Ou seja, só se o trabalhador (mesmo do privado) recebesse mais do que esse valor de referência é que o subsídio estava sujeito a imposto. Já aqui, portanto, era reconhecida a importância de ter um estatuto diferente para o subsídio de refeição, que respeitasse a sua natureza de benefício social e o excluísse das regras gerais de tributação dos rendimentos.
Mas foi em 1985 que, pela primeira vez, passou a haver discriminação positiva do subsídio quando pago em títulos, e não em dinheiro. De acordo com a legislação então aprovada, quando o valor era pago em títulos o teto máximo para isenção de imposto e de contribuições para a segurança social era até 75% acima do valor de referência fixado anualmente. Ou seja, ao receber este valor em títulos os trabalhadores poupavam algum dinheiro.
Depois de várias alterações, em 2013, já com a Lei 66-B/2012 em vigor, o limite de isenção baixou para 0% quando o subsídio é pago em dinheiro; no caso do pagamento em títulos, fixou-se nos 60% (acima do valor de referência, que continuava a ser o da administração pública).
Com a aprovação do Orçamento de Estado de 2013, o número de trabalhadores a receber subsídio de refeição em títulos passou de cerca de 45 mil para mais de um milhão.
Em 2011, recorde-se, o FMI tinha recomendado que fossem retiradas todas as isenções fiscais aos pagamentos em numerário, para combater a evasão fiscal e a economia paralela.
Finalmente, em 2018 o novo Regime Jurídico dos Serviços de Pagamento e da Moeda Eletrónica veio reforçar o estatuto excecional do subsídio de refeição. Os cartões refeição não se destinam a fazer qualquer tipo de pagamento, ao contrário de um cartão bancário, o que garante que a finalidade do subsídio de refeição – assegurar uma alimentação adequada, promovendo a saúde dos trabalhadores – não é desvirtuada.
Mercado de títulos em crescimento
Havia, em 2018, 1,2 milhões de portugueses com cartão de refeição, para os quais as empresas transferiram um valor total de 1800 milhões de euros. Cinco anos antes, em 2013, este montante associado aos cartões era de 1300 milhões de euros.
A penetração do sistema de títulos é maior no setor dos serviços (60%) e nas médias e grandes empresas (60-70%, contra 30% nas pequenas empresas), segundo o mesmo estudo da Universidade Nova de Lisboa, da autoria do Prof. Jorge Miguel Bravo.
Destes números está excluída a administração pública, onde o pagamento do subsídio de refeição ainda é feito em dinheiro.
São quatro as empresas pioneiras – Endenred, Sodexo, UP e Ticket Restaurante a operar em Portugal com o papel de entidades emissoras às quais se foram juntando várias instituições financeiras, fintechs e empresas de retalho.
O futuro dos títulos refeição
A evolução da legislação prova que as vantagens de receber o subsídio de refeição em títulos são amplamente reconhecidas – tanto para os trabalhadores, que conseguem uma poupança adicional no seu rendimento, como para as empresas e estabelecimentos de restauração e retalho, independentemente da sua dimensão.
Acresce que os títulos são, obviamente, a única forma de acompanhar a evolução tecnológica e os hábitos dos consumidores. O pagamento com cartão está hoje generalizado. Durante o confinamento a que a Covid-19 obrigou, as empresas que gerem o sistema de títulos e cartões ampliaram rapidamente a rede de restaurantes associados, para aumentar a oferta de serviços de take-away e soluções adequadas à vida em teletrabalho. Recorde-se que neste período excepcional e difícil foi mantida a obrigatoriedade do pagamento do subsídio de refeição – quando ele já acontecesse -, mesmo para quem trabalhava a partir de casa.
Os meios eletrónicos têm vantagens generalizadas, semelhantes às que a digitalização trouxe a todos os setores da economia e da vida social: simplicidade e segurança para os trabalhadores; poupança de dinheiro em tarefas operacionais para os empregadores e estabelecimentos aderentes. Para o Estado, acresce a vantagem de todas as transações serem rastreáveis, reduzindo a economia informal e aumentando a receita, por exemplo, em sede de IVA.
O crescimento dos títulos de refeição e o surgimento de novos interessados neste mercado tornam mais urgente resolver as questões de legislação ainda em aberto. A SVoucher – Associação Portuguesa das Empresas de Títulos Extrassalariais tem pedido a criação de um Estatuto dos Benefícios Sociais, com regras para a emissão, aceitação e uso dos títulos, de forma a garantir condições justas e de igualdade às empresas envolvidas e aos trabalhadores beneficiados.